Olhos fechados


Estou com sono. Não consigo entender, o tempo todo ele me acomete, como se eu fosse um alvo fácil. Não me preocupo nem em saber se estou bem. Quando me perguntam, a resposta é sempre a mesma: "Estou com sono".

Tive aquela sensação de que estava caindo e acordei. Nunca me senti tão viva. Estou brilhando no escuro. O meu sol é a lua. Não há espelhos em toda a cidade. Vejo minha luz nas gotas da chuva. Ouço uma música. Sou a musa deles todos. Eu posso dançar.

O despertador me chama loucamente avisando que é hora de acordar. E o sol insiste em me fazer abrir os olhos. Sono, antes de tudo. Antes de rir, do café, do banho, de mim. Não faço mais nada além de esperar cada segundo passar até poder dormir.

No meu quarto tem uma janela enorme. Posso ver toda a avenida e quem passa por ela. Ontem, às três horas, chovia e me vi dançando, mas não era eu. Era ela, como uma ninfa.

"Alô?". Era o analista cobrando a conta. Não sei por quê ainda compareço a porra das sessões. Sempre a mesma coisa. A rotina me dá sono.

- O que fez entre 2h e 5h de ontem?

- Sou inocente, delegado.

- O que fez?

- Eu dormi.

Nada demais. Ele me trata, na maior parte do tempo, como um criminoso que não quer confessar. Sou importante. Ele me estuda.

Hoje eu dormi com a sensação de que seria uma ótima noite. Acordei e, no teto, estava escrito "Brilhe ou morra!" em néon. Chamei a polícia. Nada aconteceu. Falaram que eu estava enlouquecendo. Tanto faz. Voltei a dormir.

Estou enlouquecendo, mesmo. Estamos, querido. Eu sou a puta deles, mas estou cansada. Estou, verdadeiramente, cansada. Me perdoe.

Ontem eu me vi pulando da janela. Mas não era eu, era ela, na minha enorme janela.

Hoje eu morri.