Trânsitos internacionais


Entrou no ônibus sorridente, com a franja reta comprida o suficiente para quase lhe tampar os olhos. O brasileiro veio a sua frente e, depois dela, seu irmão. Sentou-se próxima à janela e insistia em conversar com o irmão em japonês. Pareciam estar contando piadas um para o outro. Ela sorria, fazendo questão de não sussurrar, como se quisesse gritar o orgulho que ainda restava por ser quem era.

Em inglês, o brasileiro tentava explicar o porquê de estar gripado. A menina achou que ele queria alguma coisa. Abriu a bolsa, mas logo entendeu o que ele dizia e falou para ele se cuidar, tomar bastante água. Disse em inglês. Também orgulhoso da língua que há pouco aprendera, o rapaz respondeu triunfante: "thanks".

Ela riu sozinha, logo depois. Encostou a cabeça na janela e pensou na ironia que a vida acabara de lhe mostrar. Havia deixado sua pátria em busca de compreensão, de espaço. Queria usar as roupas que quisesse, estudar o que achasse melhor. Cursar uma faculdade, ser independente.

Encontrou certa compreensão, sim. Mas, no exato momento em que ouviu o inglês do brasileiro, notou o apego que ainda tinha por seu idioma nativo. Veio ao Brasil em busca de um lugar que a compreendesse e, agora, tudo o que mais queria era alguém para compreender sua própria língua sem esforço. Sentia falta de pegar um ônibus e ouvir um burburinho em japonês. Ir ao mercado e se esforçar para perguntar o preço do refrigerante era, justamente, lembrar de que aquele não era o seu lugar, de que estava de passagem.

O lugar que, antes, para ela, era símbolo de incompreensão se tornou abrigo da compreensão que buscava. Pelo menos, de uma parte dela. "Talvez, a vida seja exatamente isso", pensou. "Uma eterna busca por compreensão, por compreender e por se fazer compreender". Fechou o olhos por alguns segundos e sentiu vontade de chorar.

De repente, levantou a cabeça assustada e pediu ao irmão para apertar o botão que sinalizava a parada do ônibus. Antes de sair, o irmão falou ao brasileiro "See you later", dando-lhe um aperto de mão. Já ela, com um sorriso quase tímido no rosto, despediu-se do brasileiro com um alto, sonoro e radiante "tchau".